sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Barbárie - rogério generoso

barbárie: homicidas, infanticidas, genocidas e correlatos
pedófilos, homofóbicos, sóciopatas e aloprados
misantropos, necrófilos, suicidas e andrajos
aleijados, aidéticos, siflíticos e diabéticos
cardíacos, raquíticos e a metástase social;
os sem-teto, os sem-terra, os sem mais nada
os donos da pátria, os donos da rua
os senhores das armas, os agentes da morte
os automóveis mais que o vietnã
os estupradores mais que hiroshima
a fome mais que o holocausto
o bandido excelentíssimo, meretíssimo, digníssimo...
eu não vou falar mais nada
eu não vou falar mais
eu não vou falar
eu vou esperar Alarico e o cutelo
eu vou ansear o Cristo e o eterno

A PEDRA ACORDA - rogério generoso

O sono da pedra acorda

quando lhe torna imagem o escultor;

faltando-lhe ainda, a humana memória

para a glória de ser criatura, e não

do engenhoso artífice, labor.

sábado, 16 de maio de 2009

Calíope
às vezes, incessante sopra
no ouvido hipnotizado
um coro surdo e frio de bronze
como badaladas embaixo do céu
aos domingos, à espera da noiva
harmoniosa; Enquanto em mim
silenciados, os sinos no templo
ruindo, quando muito esperam
os pesares inúteis de todo o céu
aonde a música da deusa alcance

terça-feira, 12 de maio de 2009

Amago

Inverto a fechadura da porta
para que demorem a entrar
na casa de minha solidão
e saibam, a multidão de tumultos
e a desolação de vultos, reunidos
em torno do abismo que sou

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Poema sobre mote de Fátima Almeida

Ó musa de solitários homens
adormecida, em mar deitada
flutuando densa, no assoalho
quase tocando que cada um
dentro tem inacessível.

Ó musa dos deuses, bacante
ópio de verdes moços em transe
lingua sobre todas as terrenas
avara luz para poucos mortais
voz natural de água fogo e ar.

Ai de mim (musa) triste sozinho
humano e perdido entre torvelinhos
se não houvesse por graça
tua força de onde tudo se gera
em minha mão que se esmera.

Te chamo por refrigério, poesia.
"Estamos juntos;
As palavras fizeram nosso encontro."

rogério Generoso

POEMA

O poeta prega aos peixes
em lingua estranha, e esses
em piracema se atiram
ouvintes de guelras atentas.

O poeta fala aos seus
com intimidade de um deus
e esses, irados com tal onisciencia
investem vacas e muros por confidentes

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

CARTA DE UM POETA MORTO

Eu, poeta póstumo
breve infinito
deus doente de vísceras expostas
aos pedaços etc etc etc
desci ao salão de ossos; ante-sala
dos infernos de mim mesmo:
da vida fechada para balanço
da vida jogada em máquinas eletrônicas
e engoli fumaça negra de fábricas
enquanto recitava alto
meu canto azul desnorteado
em linhas de montagem com o frescor
de lírio no álamo.

Eu, que às vezes, amei mediocremente
não sei porque ainda recordo a íra
com que vieram contra mim; que ainda
recordo o amor que faltou para mim
que andei desgarrado e preso também
no fogo no tédio no sono.

Hoje, acordo denso e morto
à espera do silêncio definitivo
(os que ainda vivem, desapareceram
como rebanho de ventos
no último dia do século).
Quando ouvi isso
era como se mortificado
não pudesse afundar no silêncio
ali mesmo. Nem suportar tudo de novo;
outro dia outra infância.
Nem enfrentar algo novo
por envelhecido e com medo
de estar-me vivo apodrecendo
até o fim de tudo.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

ESTILHAÇOS

ca
cos
cacos
cacos de vidro
cacos de vidro caidos
cacos de vidro caidos espalhados
cacos de vidro caidos espalhados no assoalho
cacos de vidro caidos espalhados no assoalho da sala
cacos de vidro caidos espalhados no assoalho da sala de jantar
cacos de vidro caidos espalhados no assoalho da sala
cacos de vidro caidos espalhados no assoalho
cacos de vidro caidos espalhados
cacos de vidro caidos
cacos de vidro
cacos
ca
cos.

Nascimento do Poeta

Era o último dia de junho e morri

........................................................

até renascer na primavera
dissuadindo a Caronte barqueiro
e de Hipocrene a beber quimeras

.........................................................

era o último dia de junho e morri
atraído pelo odor das galerias
consumado em todos os meus dias
mas para a desesperança da morte
ressurgi da tíbia do novo e amei-o
: desde julho ao fim do mundo

..........................................................


era o último dia de junho e morri

deus desmemoriado e sofrendo
a peregrinação de romeiros e utopia de frades
: nos mosteiros, canto sacro
e nas ruas, de esmolas o motivo
: não temo o que seja princípio de dores
e devo a vida que tenho a morte que já sofri

.........................................................................

era o último dia de junho e morri.

Noite e Desesperança

Alma turbulenta
em corpo ágilmorto
à noite chego escasso

(de soníferas tardes
e bêbadas manhãs
migrei)

em mim uivam vigílias
:silêncios de quase abandono
e tigres a cobrir éguas senis

omoplatas suportam açoites
cataclismos nascem noturnos
:a esperança morre logo depois

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

CANTARES DA NOITE

A noite é longa.
E do longe, sombra alberga no íntimo
indiferente ao homem breve
de vigílias e náusea.

A metrópole: um milhão de sonos particulares.
A matéria do escuro (quando não havia abismo)
compondo a linha de estrelas
onde átrios pernoitam manhãs.

Essa equação sem aparato matemático
dorme artefato de corpos pretendentes
em busca de auroras presas
à meia-noite da hora.

A noite é vulva para os bêbados
bacante uivando vinículas
insônia de mortos velados.

Em sua gênese, antecede a noite
ao nada, princípio de anêmonas
esboço de signos suspensos no éter.

Na noite refugiaram-se os poetas
as putas, os funcionários públicos
os possessos profetas de alcovas
todos os gatos zincando telhados.

As palavras surgem e desaparecem
em seu percurso de poema
quando à noite, a solidão é ubíqua.

A malícia de uma mulher
aflora em sulcos de rosas
regadas em atmosfera noturna.

Os homens adormecidos dos dias inúteis, sempre
os mesmos serenos e decadentes pusilânimes
às horas escuras esperam anúncios luminosos
e suicídios em precatórios semeados.

Um dragão roxo nasce no pátio do sono, e
de suas narinas; a infância vermelha
a metálica angústia obtida
os lírios únicos anoitecidos.

Degustávamos congelados como a branca
carne de lua, ou a chama friíssima
onde voa o pássaro só, sob neblina
e o verde-amargo da solidão.

Lua!...
todas as minhas amarguras são tuas!
Enquanto eu te buscava entre estrelas
morte prematura atropelava a infância.

Todo amante já dormiu entre coxas da musa
para desespero de líricos ridículos, feitos
de rosas brancas e campos tímidos.

O meu olhar é longo como a noite;
indisfarçável é a vontade de estar
onde eu me nego.

Eu tenho o entusiasmo pela noite
como o amor que idealizara:
os ritmos dançam unânimes na madrugada

(mas esta noite não veio dançar comigo).

O Bloco EU

Ancho, como fosse o maior
sai hoje meu bloco
sem flabelo, orquestra
ou Menestrel.

A multidão não o acompanha:
só eu, de passista, corto o ar
com tesoura e dobradiça
ou bloco não haveria.

Sem fantasia... eu vou!
Alegre ou triste... eu vou!
A multidão não me acompanha.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

LAURENT (a meu filho, Laurent) parte II

Urde o tempo empalidecer-me o rosto
vendar-me os olhos, secar-me.
O futuro do corpo é extinto
mas tenho na alma secreta
inquieta e ágil de poeta
íntimo incólume e imenso conforto
no dínamo de teu nome
ou no aparato azul de julho

Pássaro sejas, para que não morras
surdo acrobata no arame que
só possa migrar ao chão durável
ou a terminar seu ato e tornar
aos vômitos quânticos
aos tímidos cânticos
ao anônimo rosto de sombra
e nada mais

Os lírios brancos...
amo-os, porque nos campos
concebem o desenho limpo
de madona desnuda e tenra;
febre que banha o intacto lençol
do líquen de nascer o invento
impregnado em carne úmida
de homem a cavalo

No silêncio das horas
de uma tarde tediosa e açoite;
de uma noite indormida e só
eu cheiro um pó de cinzas
e vou por entre nuvens
espessas do fim do mundo
acossado dentro de mim
pelo rictus da solidão

Ainda o poema duelava com o sono
despido das práticas inúteis
de nomear palavrórios
às margens de campos alvos;
e já eras signo libertado
da substância mera -- o poder
de dentro da palavra -- a palavra
que há, para que haja o poeta

O herói de corpo renovo
não prometeu vir para esse mundo
de cerco e pesadelos, ressurgido
por subterrâneas nascentes, contra
orgulhosos príncipes egoístas
e o que neles é insônia
ou metástase de seus delírios;
mas ele veio e amou

O que pode o homem sem o herói
e o herói sem o ofício?
Da chama à cinza, partem para o silêncio
de comícios definitivos, o nosso barro.
Vai assim, como jardim, teu sonho
e, sobre meu túmulo futuro já cresce
a flor sepulcral da noite
isenta de finalidades

Para ti mesmo é que vieste;
para que existas sem cessar
com tua própria linha cosendo
a tua roupagem de lírio;
de nada de anjo ou dragão roxo
do meu sonho sem mensagem
ou significação de silêncios:
para isto é que vieste.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

LAURENT (a meu filho, Laurent) parte I


Existir de que valeria
se não houvesses do amor
nascido, em infinito gozo
e no maior encanto?
Que pátria velaria eu
que mãe amaria eu
se da entranha delas
por mim amadas
não me viesses
Ser amado?

Em mim
incêndio do incêndio
eu me consumiria
noite da noite de eras
sem-fim, se não acontecesse
depois da última chuva
o teu sereno rosto
irromper luz de lamparina
em minha solidão
de tarde de outono

A represa da memória
nomeia o dia do século
de onde deixaste o casulo
no esforço de pássaro
santo ou inocente
a frequentar o céu
acima dos vaga-lumes
mirando os lírios brancos
os crustáceos em viveiros, e moças
de pernas enfiadas na lama

A tua notícia
foi evangelho as minhas páginas
a tua canção descobriu sons
olvidados em meu silêncio
(poemas carcomidos, doendo
nulos em caracteres aluminios
de letárgicas tipografias)
e me vi teu sósia, quando
estilhaçou-me os tímpanos moucos
teu choro alto a frequentar-me

O tempo a caiar-me os cabelos
perdeu seu trabalho de tempo
por causa do teu nome
e por ele cessou a sombra
que a solidão me condenara:
cessaram as perdas.
E tudo foi-me acrescentado
e tudo que me vencia
vencido estava, por dentro
por fora, por todos os lados

Há um diálogo aceso
entre mim e a tua inocência
como uma orquídea
e a mão que a cuida
de noite e de dia;
não só a planta, mas
a água e o húmus
a terra e o entorno
e desse cuidar, enfim
elaborá-se a beleza

Há uma voz e um silêncio
suspensos no espaço
em câmaras de eco
pelo fio-tempo (conduites
da energia que nos soma
e traduz nesse curvo lugar)
e ainda mais tenso
nasce o verso de agora
sob a lua da última rua
aonde estás, e, eu não mais

O rio que passa por detrás
da tua casa, desagua
antes do mar, na memória
intacta da minha retina;
passa por detrás
da tua casa, e abriga
além do peixe, a eternidade
das marés, no ir e vir
de procissões líquidas
a marejar meus olhos áridos.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Último Poema de Amor (XVI)

Eu não sei se tenho o amor
que alguém espera de outro alguém.
Eu digo: -- Calma --, e logo
um homem explode
no centro de Beirute.

O amor então, não se realiza
de mim para aquele suícida.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Três Poemas Incidentais

I
A companheira na luz
eleva meus carinhos
e, na sombra aplaca
meu sofrimento.
É lanterna violeta
que a tarde gris vence
e, em minha gloriosa noite
deita-se comigo qual
um mar estendido na
da praia, branca areia.

II
Só às indiferentes camas
deitei minha vigília
e ardi sonolento
no pavimento das eras.

III
Nas marquises do infinito
nos assoalhos do mundo
nos jardins ulteriores
guardarei espólios de pedra
mar e sangue.

A Palavra no Artista (A Silvio Hansen)

A escrita quase não-lhe interessa.
É como rumor de tarde ante o gozo
de tinta estendida sobre o leito da tela à noite
entre uma cerveja holandesa e um gato azul
que se vai tomando forma ao lado
de orquídeas e musgos vocábulos
infiltrados a dedo, e fluxos contínuos.

A escrita quase não-lhe comove.
Consumiria-o não fosse etílica lua
a guiá-lo por ruas bêbadas, enquanto uiva
divaga, grita ou incendeia as menstruações
de Penélope tecendo rendas por honra
de Ulisses (ou Joyce), em gesta de poemas
derramados de sua fronte, sobre ávida página

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Arquitetura do Sono

No meu sono o limpo
e o sujo dormem a mesma angústia
de silêncio estacionado na memória.
Inútil seria ofertar-me um cálice de vinho
ou transfusão sanguinea: minha edição original
é poligrafia de pedra.

Em mim a sarça não arde
e o deserto fríissimo queima
as asas do pássaro, enquanto inocula
de amianto o peito de homem.

No meu sono
lúcifer despediu-se desalento
e Deus vigia que eu não salte
do parapeito do mais alto edifício

No meu sono
prometi os campos do céu:
as coisas longinquas não comovem
as musas da tarde; tocando nelas
demoradamente, ofertam-se rosas, prosa...
mas o poema na região do sono

talvez não se liberte entre o abrir de olhos
e escovar de dentes.
-- E outra vez o silêncio
estacionado na memória.

Que Mais Há a Dizer?

Que mais há a dizer?
Pátios vazios
féretros de anjinhos
tomates rubros de véspera
rumores do aroma de Dulcinéa
pedras portuguesas do cais;
ilhas de Neruda
cores de Miró
narcisos amando outros
o rio capibaribe sem pontes
a ponte de ferro sem rio
o inexistir

A úbere fêmea
a ubiquidade de Tánatos
o terceiro reich, a panacéia
a higiene dos octogenários
a literatura pobre da ex-literatura
a poesia enjoativa decassílaba;
a crema a crisma o creme chantilly
a alfazema Hugo Boss, a América
o toque de recolher, todos os tiranos
a meta: física, linguagem, etc.
a palavra CONCRETA, a reta
Que mais há a dizer num poema?

-- Eu prefiro abrir a janela

Serenata

Talvez, Lygia
me espere na manhã
de sinos, lírios e violinos.

Eu, entanto
às entranhas da noite
uivo outro nome.

Oi Pessoal

Oi Pessoal,

Começo uma nova etapa na veículaçao dos meus trabalhos, espero que este espaço nos aproxime, e nos remeta ao fim (essencial) da poesia, criar a beleza ou a estranheza, enfim, o sublime.

abraços

rogério generoso